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The Weeknd, o filho da madrugada
Rúben Viegas

The Weeknd, o filho da madrugada

Grande espetáculo em Algés de emoções, luzes e de outros efeitos.

Perante uma multidão de dezenas de milhares de pessoas no Passeio Marítimo de Algés, The Weeknd foi a estrela caída do céu, que o dominou, não só com efeitos de luzes e com canções ligadas ao éter, como também secundarizou a ameaça dos primeiros assomos da tempestade Óscar, que se limitou a borrifar o público com umas gotas de água de forma continuada que até deram jeito para refrescar.

As duas horas do espetáculo tiveram vários fios condutores que não romperam. O r&b de The Weeknd é em quase permanência uma espécie de r&b num vaivém espacial da NASA, ou chamemos-lhe também de um disco-sound futurista e vertiginoso. A prioridade do alinhamento foi para as faixas dos seus dois álbuns ambientados na madrugada, After Hours e Dawn FM. A pista da discoteca megalómana de The Weeknd abriu-se ao som de Take My Breath, num rolo compressor que disparou também Sacrifice, How Do I Make You Love Me? ou, mais tarde, Heartless. 

Parecia que o público conhecia todas as canções, em especial as raparigas adolescentes, com percentagem alta no meio de um público bastante diversificado. Esse coro de milhares de vozes fez-se notar ainda mais em Starboy, tema-titulo do álbum de 2016, que também mostrou o seu peso no alinhamento, incluindo a surpresa de Reminder, que há muitos anos The Weeknd não cantava ao vivo. Abel Tesfaye passou em revista toda a sua carreira em menos de duas horas: os seus vários álbuns, mixtapes e EPs, numa carreira recheada, com pouco mais de dez anos.  

The Weeknd, quando surgiu em palco às 21 horas e picos, estava de túnica e de máscara prateada, tal e qual um membro de uma sociedade secreta ao estilo do filme de Stanley Kubrick, "Eyes Wide Shut". A imagem dava-lhe um ar tão intigrante, que tudo o que fazia, incluindo as danças, parecia enigmático e até mesmo sinistro. Lentamente, foi-se desfazendo das suas proteções e vestes, passando-se a ver o seu rosto só a partir de meio do concerto, com uma espécie de gorro que parecia uma bandana maior. Revelou-se uma pessoa simpática. E sempre que pôde, falou muito bem de Portugal: o facto de já não atuar no país há vários anos, as saudades que sentiu do concerto no NOS Alive de 2017 (naquele mesmo recinto) e a sensação de se sentir em casa quando atua neste cantinho da Europa.

Havia também numerosas figuras mascaradas e de túnicas, que pareciam múmias que caminhavam como fantasmas e que de repente avivaram como dançarinas de corpo inteiro, cpm coreografias rigorosas. Nunca interagiram diretamente com The Weeknd mas sim com o  boneco cromado e futurista, que era a novidade do espetáculo After Hours til Dawn Tour, colocado a meio da arena, longe do palco principal.

Esse boneco, que parecia uma estatueta dourada daquelas que se entregam em Hollywood para premiar os melhores do cinema, faiscou umas luzes e pouco se virou. Mais impactante era o cenário de arranha-céus do palco principal que desligado de luzes era um conjunto amorfo de metais. lluminado era outra coisa bem mais viva e de onde irrompiam labaredas de fogo. Ali no meio do fogo, atuavam ao alto um guitarrista, um baterista e o teclista e saxofonista. Tocavam quase escondidos, a dar o palco por completo a The Weeknd.

As labaredas de fogo em palco eram uma constante, deixando um cheiro a candeeiro de óleo gigante acabado de desligar. As pausas de 30 segundos pareciam uma eternidade, atendendo à forte dinâmica do espetáculo. E os raios de luzes do palco apontavam para o céu, concentrando-se num ponto lá ao alto que parecia uma aparição. 

Há um momento mais profundo, Out of Time, que conduz The Weeknd para outro ex-libris do palco, a bola da lua cheia suspensa no ar. Para a ponta final, as pulseiras eletrônicas distribuídas às pessoas começaram a colorir-se de luzes, numa altura em que a arena parecia uma rampa inclinada para a elevação final, com temas apetrechados de glória, como o obrigatório Save Your Tears, Less Than Zero e o cintilante Blinding Lights.

O concerto em Algés ganha uma duração maior do que o normal, com um encore verdadeiramente diferente do que tínhamos visto no set tradicional. The Weeknd opta por cantar dois dos temas da banda sonora da sua série "The Idol" (que passa na HBO), como Double Fantasy e Popular, com o cantor lá no alto dos arranha-céus, mais compenetrado e menos exuberante. O criador está vivo. Em dez anos, criou um império que cintilou de felicidade nesta noite. Felicidade foi o que se sentiu em toda aquela gente, em duas horas. 

Gonçalo Palma

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